No
Arquivo Público do Estado da
Bahia podemos encontrar documentos da Polícia
Militar informando que deveria ser feita uma negociação
com Zé Sereno para que este se entregasse, dando
garantia de vida para ele e seus cabras.
O
ataque que dizimou o bando de Lampião, comandado
pela volante de João Bezerra, resultou na morte
de 11 cangaceiros e durou cerca de 20 minutos. Em
Angicos, Lampião havia reunido vários
subgrupos como os liderados por Zé Sereno e
Ângelo Roque (Labareda), faltava apenas Corisco.
Segundo Dadá, a mulher do segundo cangaceiro
mais famoso, no depoimento dado a José Umberto
Dias (entrevista este que gerou o livro Dadá),
Corisco estava para atravessar o rio São Francisco
para se encontrar com Lampião, mas um informante
o aconselhou a não ir naquele momento, pois
havia muitos policiais na região. O resultado
foi que Corisco ouviu, durante o dia amanhecendo,
alguns tiros que estavam sendo disparados durante
o ataque da volante de João Bezerra. Muitos
cangaceiros conseguiram escapar, mas 11 foram mortos
e decapitados. As cabeças cortadas serviam
para mostrar que Lampião realmente havia sido
eliminado; levar os corpos daria mais trabalho e era
preciso apresentar alguma prova, já que em
outras oportunidades falsas notícias da morte
do cangaceiro foram espalhadas. Só que dessa
vez não teve erro. Frederico Pernambucano de
Mello, no livro Guerreiros do sol: violência
e banditismo no Nordeste do Brasil, considera o ataque
de Angicos dentro de um contexto ligado ao “ciclo
de ferro e fogo da repressão do Estado Novo
a movimentos populares considerados arcaicos”.
Provavelmente esta repressão poderia ser enquadrada
como parte da concepção de modernização
do governo Getúlio Vargas.
A
partir de algumas pesquisas podemos notar como o cangaço
e a perseguição aos cangaceiros alterava
a vida de muitos sertanejos. No auto de perguntas
feito ao cangaceiro Jonas Celestino dos Santos, conhecido
como Quina-Quina, este declarou que antes de entrar
no bando de Balão (subgrupo de Lampião)
sofria perseguições tanto das volantes
das forças legais como dos cabras de Lampião
e a solução encontrada foi se juntar
aos bandidos em 1936. Após o massacre em Angicos,
Quina-Quina se entregou em Jeremoabo (no interior
da Bahia). Neste contexto percebemos o sofrimento
de muitos indivíduos que tiveram suas vidas
marcadas na guerra que envolvia cangaceiros e os policiais
das volantes do sertão.
Difícil
é entender como um homem como Lampião
que levou vários anos no cangaço “conseguiu”
morrer após um ataque praticamente sem resistência.
Que plano o sargento Bezerra usou para dar fim a Lampião?
Após a polícia descobrir quem estava
ajudando os cangaceiros só restava saber onde
era o esconderijo. Para obter a informação,
as forças legais tiveram que usar a violência.
Os irmãos Pedro de Cândida e Durval Rosa
(que sabiam onde o bando estava escondido) apanharam
muito e acabaram abrindo o bico.
Após
a morte de Lampião, Corisco assumiu o posto
de vingador. A vingança caiu sobre o vaqueiro
Domingos Ventura (avô da esposa do comandante
João Bezerra e coiteiro de Lampião)
que foi assassinado pelo Diabo Louro. Mas Corisco
não sabia quem realmente havia informado a
João Bezerra sobre a localização
de Lampião. Duas mulheres também foram
assassinadas e decapitadas para vingar a morte de
Enedina e Maria Bonita. Este fato chegou a ser notícia
nos EUA onde a Time Magazine publicou um pequeno texto
sobre a morte de Lampião e a vingança
de Corisco. Não importa de qual lado o sertanejo
estivesse: ele poderia ser vítima tanto da
violência de cangaceiros como das volantes.
Depois
de tanto tempo, Lampião ainda é lembrado
em rodas de conversas sertanejas, pesquisas de historiadores,
antropólogos e sociólogos. Sua história
chegou também ao cinema e à literatura
de cordel onde o rei do cangaço é mostrado
como o protótipo do cabra valente do sertão.
*Professor
de História da FTC EAD e Pós-Graduando
Lato Sensu em História Social e Econômica
do Brasil pela Faculdade São Bento –
BA
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