Ponto
mais polêmico do Plano Nacional
dos Direitos Humanos (PNDH) no capítulo
que trata do tema comunicação, a
proposta de controle social da mídia
foi claramente rejeitada pelo ministro
das Comunicações, Hélio Costa, e
pelo deputado federal e ex-ministro
da Fazenda Antonio Palocci, um dos
coordenadores da campanha presidencial
da pré-candidata do PT, a ministra
Dilma Rousseff. Ao participarem
do fórum Democracia e Liberdade
de Expressão, organizado em São
Paulo pelo Instituto Millenium,
Costa e Palocci deixaram claro que
também na questão do controle social
da mídia há uma grande distância
entre o pragmatismo do governo Lula
e o pensamento predominante em extensas
áreas do PT.
Costa garantiu que em nenhum momento
o tema foi debatido no governo,
que não proporá a criação de mecanismos
de controle dos meios de comunicação.
"Consideramos essa questão
absolutamente intocável." O
controle social da mídia, afirmou,
"é inadmissível, primeiro,
para o jornalista e, segundo, para
o ministro das Comunicações".
Palocci, embora evitasse críticas
diretas ao PNDH ? pois o assunto
comove a base petista, com a qual
não quer criar atritos ?, disse
não concordar com a forma como o
tema foi tratado no documento. Em
seguida, fez uma firme defesa da
liberdade de imprensa como instrumento
para balizar a ação dos governantes
e mostrou os limites da crítica
sob o Estado de Direito: "Os
governos precisam de uma atuação
forte e democrática da imprensa.
Os governos autoritários tendem
a desabar por não permitirem o equilíbrio
proveniente da crítica. Não digo
que a crítica é agradável, mas ela
é necessária. Agora, se houver calúnia,
a Justiça está aí."
Nitidamente inspirado nas posições
defendidas por diferentes alas do
PT ? que de tempos em tempos propõem,
sob diversos argumentos, formas
de controle social da mídia ?, o
PNDH condiciona a concessão dos
serviços de radiodifusão, e também
a renovação dessa concessão, ao
respeito aos direitos humanos e
propõe penas como advertência, multa,
suspensão da programação e até cassação
da concessão, "de acordo com
a gravidade das violações praticadas".
A proposta abre caminho para o domínio
dos meios de comunicação pelos governos,
como deixaram claro jornalistas
da Venezuela, Equador e Argentina
que participaram dos debates. Foi
sob o pretexto da necessidade de
impor responsabilidade social aos
veículos de comunicação que os governos
desses países adotaram medidas de
controle sobre a mídia, inclusive
a censura pura e simples.
Na Venezuela, o presidente Hugo
Chávez suspendeu concessões de emissoras
de rádio e de televisão; no Equador,
o presidente Rafael Correa, inspirado
por Chávez, vem utilizando cadeias
nacionais de rádio e tevê para seus
discursos políticos; na Argentina,
além de perseguir veículos de comunicação,
tentando inviabilizar sua sobrevivência
econômica, o governo da presidente
Cristina Kirchner conseguiu obter
do Congresso a aprovação de uma
lei que restringe a atuação dos
meios de comunicação.
Há uma diferença entre a situação
do Brasil e a desses três países,
como destacou o diretor da Folha
de S.Paulo, Otavio Frias Filho,
pois aqui a democracia está mais
consolidada. Mas, ressalvou Frias,
a história mostra que governos que
desfrutam de altos índices de popularidade
são mais tentados a investir contra
o Congresso e a calar a imprensa.
No caso brasileiro, deve-se acrescentar
a imutabilidade do pensamento petista
a favor do controle social da mídia
e sua insistência em apresentar
propostas nesse sentido. No que
depender do PT e do petismo, a liberdade
de imprensa continuará sob risco
permanente.
Felizmente,
como destacou o sociólogo Demétrio
Magnoli, há uma diferença entre
o governo Lula e o PT, entre o lulismo
e o petismo. Enquanto Lula, por
pragmatismo, aderiu aos princípios
da economia de mercado, o PT continua
a defender, em seus documentos internos,
a ideia de um partido forte que
consiga impor normas à sociedade,
um processo que Magnoli chama de
"restauração stalinista".
Enquanto Lula estiver no governo,
as ameaças à liberdade de imprensa
parecem controladas. Mas o que poderá
acontecer se outro nome do PT ocupar
a Presidência da República?. |