Está mais difícil
obter empréstimos. Os analistas de crédito
acompanham com cuidado a evolução
dos pagamentos em atraso e já constataram
que, embora o crescimento dos índices gerais
de inadimplência não chegue a preocupar,
no segmento de financiamento de automóveis
eles vêm subindo contínua e rapidamente
desde dezembro. Por precaução, as
instituições financeiras aumentaram
as exigências para conceder financiamentos.
Entre os critérios mais rigorosos utilizados
na análise do cadastro dos candidatos a
empréstimos está a fatia da renda
que pode ser comprometida com as prestações,
que foi reduzida em até cinco pontos porcentuais.
Instituições que aceitavam o comprometimento
de até 35% agora limitam a prestação
a, no máximo, 30% da renda.
O índice de inadimplência detectado
em maio pelo Relatório de Crédito
do Banco Central, de 7,3%, é pouco superior
ao de abril, de 7,1%. No caso dos automóveis,
os pagamentos com mais de três meses de
atraso passaram de 3% em dezembro para 3,7% dos
financiamentos. Por causa desses números,
da aceleração da inflação,
que afeta diretamente a renda real da população,
e do risco de desaceleração da economia,
que reduziria o nível de emprego, as instituições
financeiras estão mais cautelosas.
Aos dados usualmente utilizados no cadastro dos
tomadores de empréstimo - nome, endereço,
renda, CPF, entre outros -, as instituições
financeiras estão acrescentando informações
colhidas em entrevistas com o interessado, como
mostrou reportagem de Márcia De Chiara
publicada segunda-feira pelo Estado. Entre os
novos dados solicitados estão a data de
recebimento do salário, para verificar
se é compatível com a data de vencimento
da prestação, e a existência
ou não de outras dívidas em nome
do interessado.
O rigor é aplicado no exame de todas as
propostas de empréstimo, mesmo as que envolvem
garantias, como o financiamento de veículos.
Um dos maiores bancos do País estima que,
com os novos critérios de análise
do crédito ao consumidor, o índice
de rejeição de propostas cresceu
10%. O último Relatório da Inflação
do Banco Central já identificava essa tendência:
"A procura de recursos bancários apresentou
relativo arrefecimento na margem de abril para
maio, evidenciando a redução do
dinamismo do crédito pessoal."
As operações de crédito
do sistema financeiro, como porcentagem do PIB,
estão no seu nível mais alto dos
últimos 20 anos. Em meados de 1988, elas
representavam 34% do PIB. A aceleração
da inflação, depois do fracasso
de mais um plano heterodoxo colocado em prática
pelo governo Sarney, fez cair gradualmente essa
relação. Em março e abril
de 1990, no Plano Collor, ela chegou a apenas
20% do PIB, crescendo, desde então, até
ultrapassar 30% do PIB nos meses que antecederam
o Plano Real. No segundo semestre de 1994, em
plena euforia do Real, alcançou o recorde
de 36,8% do PIB, caindo paulatinamente, desde
então, até chegar a 24%, que foi
a média dos dois primeiros anos do governo
Lula. Desde 2005 vem subindo e, em maio último,
chegou a 36,5% do PIB, praticamente o nível
alcançado no auge do Plano Real.
Até agora, os membros do governo, a começar
pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
não demonstraram preocupação
com esse avanço. Eles argumentam que o
nível de inadimplência é relativamente
baixo, a economia continua a ter bom desempenho,
os indicadores de salário e renda justificam
os riscos assumidos pelos tomadores de empréstimo
e que o próprio mercado poderá fazer
os ajustes, restringindo os financiamentos. O
encarecimento do crédito, em decorrência
do endurecimento da política monetária
pelo Banco Central, por sua vez, tende a reduzir
a demanda por crédito.
Sem esperar pelos efeitos previstos pelo governo,
as instituições se protegem. "O
que as financeiras estão fazendo hoje é
olhar com mais atenção para a renda
e a inflação, para evitar problemas
futuros", diz José Arthur Lemos Assunção,
vice-presidente da Associação Nacional
das Instituições de Crédito,
Financiamento e Investimento (Acrefi). Talvez
elas estejam enxergando mais longe que o governo.